Assisti ontem a uma récita da ópera Orquídea Branca que estreou no Funchal no dia 27 de Outubro.
As expectativas eram altas, uma vez que as notícias e críticas que foram surgindo na comunicação social eram bastante positivas.
Afortunadamente tive acesso a um bom lugar no teatro, que permitiu ter uma visão completa de palco e que, supostamente, será um bom local em termos acústicos. Digo supostamente porque foi utilizada amplificação acústica para vozes solistas e orquestra. Este foi, a meu ver o maior "senão" de todo o espectáculo. Os cantores de ópera não usam microfones nos teatros de ópera. Uma das características mais importantes de um cantor é a capacidade de projectar a voz.
Sei que a acústica do Baltazar Dias não é das melhores, de qualquer forma a acústica poderia ter sido melhorada recorrendo a artifícios de palco.
Tudo isto para dizer que a minha opinião sobre os cantores fica imediatamente comprometida por ouvi-los todos com o mesmo volume sonoro.
Mas antes disso, gostaria comentar a ópera em si.
O libreto de João Aguiar é interessante. Uma história de amor entre uma princesa e um jardineiro. A princesa chega ao Funchal para se curar de febre tísica, mas no final sucumbe. Tipicamente uma ópera romântica.
A encenação do Miguel Vieira é, para mim, um dos pontos altos desta produção. Os cenários e figurinos estão muito bem conseguídos. A conjugação do antigo com o novo e do tradicional com o moderno está perfeita.
A composição de Jorge Salgueiro não me satisfez completamente. A utilização excessiva de "staccato" nos recitativos, não é agradável. Esta característica mantém-se ao logo do toda a obra, mesmo nas árias duetos e tercetos, tornando-a pesada e um pouco monótona. No entanto, os coros, o dueto entre Maria Amélia e José Maria e as duas árias de José Maria fogem a esta regra e são as partes que mais apreciei.
Na generalidade a composição parece-me excessivamente ligeira, o que, muitas vezes ao longo do espectáculo, me levou a pensar que estava a assistir a um musical e não a uma ópera.
Finalmente as vozes.
Como já referi, a utilização de amplificação não me permite formar uma opinião comparativa entre potência e projecção vocais.
As vozes de Lúcia Lemos (Imperatriz), Rui Baeta (Zé Maria) e Carlos Guilherme (cónego) são de destacar. De entre os três, preferi Lúcia Lemos (soprano), com uma voz segura e encorpada, mas que infelizmente não tem, nesta obra, uma ária à sua altura. Mesmo assim, destacou-se especialmente no segundo acto.
Rui Baeta (barítono) esteve bem. Entrou um pouco a medo no registo agudo, mas melhorou bastante no segundo acto. De notar que a personagem do José Maria tem as duas mais belas árias de toda a ópera.
Carlos Guilherme /tenor) esteve um pouco contido no primeiro acto, melhorando bastante depois. De qualquer forma, a sua personagem não tem também uma ária onde os dotes vocais do cantor possam ser convenientemente demonstrados.
Carla Moniz (soprano) no papel principal de D. Maria Amélia (princesa) teve uma prestação mediana. Pouco comovente. Uma voz contida e ligeira. Confesso que desconhecia a cantora e que esta apreciação se pode dever à interpretação que fez da personagem.
Dos solistas secundários destaco Diocleciano Pereira (tenor) no papel de Comandante da Fragata Dom Fernando e Inês Madeira (mezzo-soprano) no papel de Rosinha.
Globalmente considero a produção da Orquídea Branca muito aceitável.
Vale a pena ver.
Publicado também no Folhas Pautadas e no Bel canto Opera
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