domingo, 3 de abril de 2011

A Bolena de Netrebko

Como referi aqui no Outras Escritas, ontem consegui ouvir via Internet os segundo e terceiro actos da ópera Anna Bolena de Gaetano Donizetti, nova produção da Wiener Staatsoper (Ópera de Viena).

O facto de o papel de Anna Bolena ser pela primeira vez interpretado pelo soprano Anna Netrebko, fazia da estreia de ontem um ponto alto da temporada de Viena.

Como é sabido, não aprecio as interpretações deste soprano no repertório de belcanto. No entanto, pelo que ouvi ontem, Anna Netrebko não esteve nada mal. Com sua voz escura, a cantora esteve muito bem nas passagens mais graves e, conscientemente, evitou quase todas as notas sobre-agudas, excepção feita na ária Al dolce guidame que terminou com um agudo na dominante que não é nada comum. Esta ária será das mais difíceis de toda a ópera e Netrebko interpretou-a bastante bem, mas evidenciando alguma deficiência ao nível das respirações.

Garanca interpretou Giovanna Seymour tão bem como em Barcelona. O dueto com Netrebko foi um dos pontos altos da récita, tendo recebido o merecido aplauso do público. A aria do segundo acto foi magistralmente interpretada, mas sem repetição. Não percebi porquê, uma vez que a cantora não tem quaisquer problemas em fazê-lo como demonstrou em Barcelona.

Francesco Meli foi um Perci convincente embora se tenha esquivado a repetir a ária do terceiro acto e evitado o agudo final.

ldebrando D'Arcangelo foi razoável com Enrico VIII, embora nalgumas passagens tenha, aparentemente, alterado a partitura, fazendo uma abordagem mais grave (não tenho bem a certeza deste facto).

A condução de Evelino Pidò e a Filarmónica de Viena foram excelentes.

8 comentários:

  1. Caro Alberto,
    Quando tiver a oportunidade de ouvir a Netrebko ao vivo, vai ver que concorda comigo: é, na actualidade,um dos melhores sopranos líricos no activo!

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  2. Caro FanaticoUm

    Vamos ver, se um di Netrebko me vai convencer no Belcanto. Devo confessar-lhe que me surpreendeu na Anna Bolena, qua, não sendo excepcional, foi de um nível muito superior ao que eu esperava (do ponto de vista vocal).

    Teve oportunidade de ouvir a récita?

    Garanca foi muito superior no dueto, no entanto, já li críticas que deitam a cantora por terra dizendo que a sua voz é muito metálica e técnica e que Netrebko foi muito superior do ponto de vista interpretativo. Ora, são estas coisas que eu não gosto! A Netrebko até pode cantar de cabeça para baixo, no entanto, tem que ter voz... e técnica e bom gosto vocal. O Belcanto vive disto.

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  3. O Belcanto é um reportório, a meu ver, para vozes que sejam preferencialmente ágeis, algo que de facto a Netbreko tem algumas falhas. No entanto a sua voz não tem igualmente carga dramática suficiente para me convencer no reportório de Verdi, Massenet e muito menos de Wagner.
    E é esse o meu problema com ela:
    da voz pouco posso dizer, ela canta maravilhosamente, "aldrabando" um agudo ou grave aqui e ali, mas "aldrabanços" compreensíveis visto que mesmo as sopranos ditas de topo igualmente "aldrabam" (falando de performances ao vivo, obviamente). O problema é que a voz dela peca por ser demasiado híbrida, parece estar naquele ponto do meio-termo constantemente. Em relação à sua capacidade como actriz, devo dizer talvez ser este o seu pinto forte. A sua linguagem corporal é fantástica em palco, convencendo e bem. Daí talvez se perceba que ao vivo o impacto da sua actuação deve ser grande.

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  4. Não tive oportunidade de ouvir, infelizmente. Mas, se tudo correr como previsto, espero ouvi-la (e vê-la) no Met Live da próxima temporada. Será a primeira!
    Cumprimentos

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  5. @ Anónimo: Quando falo de Netrebko, tenho sempre algumas reservas, porque nunca vi nem ouvi a cantora ao vivo. De qualquer forma, a sua voz não é nem nunca será a mais indicada para interpretar Donizetti, nem mesmo Bellini. Rossini, acredito que nunca o fará e ainda bem. Surpreendeu-me pela positiva na Anna Bolena ao fazer uma abordagem inteligente atendendo às suas limitações vocais (para Belcanto, entenda-se). A voz é escura demais (mas a da Callas também era), não tem pianíssimos e os trilos são questionáveis. De qualquer forma, a cantora compensa estas questões com a interpretação do ponto de viste cénico.
    Claro que hoje em dia a ópera vive muito da representação cénica e por isso Netrebko é considerada uma das melhores. Repare que algumas críticas dizem que Garanca interpretou com muito melhor voz a o dueto com Netrebko, mas a nível cénico Netrebko foi melhor e por isso ganha.
    Por exemplo, a Bolena da velhinha Gruberova (em Barcelona) está a léguas de distância desta, no entanto a Opera News dá um destaque enorme a Netrebko e nem fala de Gruberova.
    Já agora, penso que Netrebko deve ter já a Norma nos seus planos...

    @ FanaticoUm: Tenho pena que não tenha ouvido. Valeu muito a pena, embora o som não fosse grande coisa. Espero também assistir no Met Live e, quem sabe, no MET a sério :)

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  6. Caro Alberto,
    A Netrebko nao tem pianissimos?? Por favor!! Tem mesmo que a ouvir. Desculpe estou num computador sem acentos.

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  7. Creio que estou a perceber o que o Mário quis transmitir.
    Mario del Mónaco ou Franco Corelli também tinham pianíssimos. Seriam os seus pianíssimos e cadências adequadas para Bel Canto? Certamente que não, pois seria como esperar que um comboio ao travar parasse instantaneamente. Peço desculpa pela brusca comparação, mas creio fazer-me entender. Assim como uma voz dramática não consegue fazer o que uma voz lírica-ligeira consegue, o mesmo se verifica ao contrário. É preciso ver que nem todos podem ser um Giacomo Lauri-Volpi ou uma Leontyne Price com vozes abençoadas que conseguem adaptar-se a qualquer reportório sem denotar dificuldades de maior.

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  8. @ Anónimo: Não é Mário, mas sim Alberto (risos). A ideia é basicamente essa. Os exemplos que deu são elucidativos. Um pianíssimo de um cantor dramático não é um pianíssimo de um cantor lírico-ligeiro. Nem tem que ser. É nesse sentido que refiro que Netrebko não tem pianíssimos.
    Já agora, tenho como referência os pianíssimos de Caballe e de Gruberova.

    @ FanaticoUm: Já ando a tratar da próxima viagem a Nova Iorque! A ver se é desta que oiço a Netrebko (1 de Fevereiro de 2012)

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